Gilberto Freire e a frescura do não politicamente correto

Tenho estado a ler a Casa Grande e Sanzala com muito interesse, por muitas razões, mas a principal e mais absurda é compreender até que ponto chegámos a um 1984 no sentido linguístico, em que não podemos dizer nem metade do que ele diz sem sermos acusados de (a ordem não é importante): racistas, anti-semitas, xenófobos, machistas, sei lá mais o quê. Sobretudo aqui na Noruega que até a cor da pele é tabu. Seria possível traduzir para norueguês atual? Duvido!

Por um lado, a minha consciência nacional horroriza-se com o que ele diz sobre os portugueses, mas tenho de ser equânime e dizer que não diz melhor (os comentários são diferentes mas não escapa nenhuma raça ou pessoa) sobre os  índios, os brasileiros, os americanos, os jesuítas, os ingleses, nem mesmo muitos negros.

Ou seja, a quantidade de adjetivos e de opinões que Gilberto Freyre desenvolve no seu livro dariam para centenas senão milhares de obras sobre cada assunto. Dada a cobertura e profusão de dados e opiniões, ninguém certamente pode concordar com todas; dada a possível menor cobertura de muitos assuntos sobre os quais ele versa como a alimentação, a higiene, a linguística, a genética e a agricultura, muitas das teses ou argumentos dele podem devem mesmo!) estar ultrapassados, mas, deixem-me aqui dizer: que  cultura! que inteligência! que cabeça!

Embora tenha de admitir que comecei a ler, desconfiada, ao saber (pela Wikipédia) que ele tinha sido armado cavaleiro ("sir") pela rainha de Inglaterra -- e na minha opinião a pérfida Inglaterra tem-se empenhado no denegrir Portugal pelo menos nos tempos modernos -- acho que este livro, pela riqueza de informações e pela forma como está escrito, é absolutamente essencial para quem quiser saber algo do Brasil ou de Portugal.

 

Emneord: Brasil, história, lusofonia, língua Av Diana Sousa Marques Santos
Publisert 27. juli 2014 18:46 - Sist endret 15. juli 2015 10:28