Política académica: o que fazer?

Eu sei, eu sei, que a mais célebre citação de "O que fazer?"/"Que fazer?", o livro do Lenine, não é realmente uma pergunta, ou será, melhor, a resposta à pergunta do título. Infelizmente esta entrada no meu blogue é realmente uma pergunta a que não sei realmente dar solução.

A situação -- caricata, na minha opinião, mas o sentido de humor é coisa não partilhada entre os meus chefes e eu -- é que foi decidido (não se sabe por quem, porque a chefia é "modesta", ou antes invisível ou irresponsabilizável) que iriam abrir uma posição para a nossa secção (estudos ibero-românicos) chamada "brasiliansk tekstkultur" -- expressão esta que, não tendo sentido, é impossível de traduzir, mas qualquer coisa como "cultura textual brasileira", se eu fizer um grande esforço de tentar pôr algum sentido em algo que nunca ninguém nos explicou o que é -- quando pedimos uma posição em literatura lusófona -- quer dizer brasileira, portuguesa, africana de expressão portuguesa, etc., mas literatura... E que dissemos que, se necessário fosse, a pessoa de literatura podia ser chamada a dar aulas de cultura (lusófona, não preciso de repetir o que tral significa...)

Ora, após termos visto com espanto -- e, é verdade, uma certa indignação por fazerem uma proposta destas sem ligar ao nosso pedido -- a tal proposta de uma posição só em "brasiliansk tekstkultur", tentámos dar várias explicações de porque é que a literatura era importante (pelo menos no mundo lusófono), e apontámos o facto de que havia cerca de metade dos alunos interessados em África ou em Portugal e que por isso a restrição ao Brasil parecia-nos contraproducente, e também perguntámos exatamente o que significava "tekstkultur". Depois de observar no google que tal colocação não existia em lado nenhum que não fosse nas cabeças da nossa liderança...

Resultado: fui apelidada de "difícil", após tentar dar estas explicações todas e pedir explicações sobre a razão de tão estranha proposta, e recebi ontem (recebemos todos ontem) uma nova proposta (para o departamento todo, sobre todas as secções) a dizer exatamente o mesmo em relação à nossa: contratação de um professor em "brasiliansk tekstkultur", como se não tivesse havido qualquer retorno ou opinião das pessoas que realmente têm a ver com a área...

Pergunto: isto é uma diferença de culturas clássica, e eu devo apenas dizer «mas que bela ideia, um nome tão inteligente e inovador para aquilo que queremos: literatura em português, com ênfase especialização em literatura brasileira» porque este nome antigo cheira a vetusto e os chefes dos chefes não vão aceitar?

Ou isto é uma maneira de estragarem completamete o curso de português e transformarem-no num apêndice dos estudos da América Latina (cujos dois professores, norueguessímos, falam espanhol mas não percebem uma palavra de português -- e pior, nem querem perceber), contratando uma pessoa da comunicação social ou "media studies"?

Mesmo que não haja este perigo -- que eu penso que existe -- devo aceitar algo que não faz sentido sem que use o meu direito (tenho direito, numa universidade de um país democrático?) de dizer que discordo totalmente desta decisão, e explicar porquê?

Eu acho que não, que não devo aceitar algo com a mera justificação de que "os nossos chefes sabel melhor so que nós" (visto que sei, que no caso em questão, não sabem nada de Portugal ou do Brasil ou de coisa nenhuma que tenha a ver com a cultura lusófona). Mas pode ser uma diferença cultural, claro! Por isso a pergunta. Que fazer?
 

Emneord: política Av Diana Sousa Marques Santos
Publisert 22. aug. 2014 18:51 - Sist endret 15. juli 2015 10:28