Curto prazo ou estratégia?

É triste ver que um conjunto substancial de brasileiros acha que é mais importante um protesto circunstancial do que uma posição estratégica em relação à língua, que teria consequências muito mais relevantes e positivas para o Brasil na Noruega.

Desde há quase dez anos que tenho tentado passar a mensagem de que é importante saber português para compreender e portanto negociar ou comunicar com o Brasil. Esse é um assunto estratégico para a Noruega, não por causa de Portugal nem mesmo por causa dos países africanos de expressão portuguesa, e foi por isso que dediquei ao Brasil a maior parte da brochura Portugisisk (exatamente virada para convencer os alunos e os seus pais a investirem na aprendizagem do português).

Uma estratégia que faria com que houvesse hoje na Noruega muito mais conhecimento, comunicação e compreensão de um país com um peso extraordinário hoje em dia, não menos importante por ser neste momento dirigirido por uma personagem que se pauta por uma ignorância avassaladora, e que "pia" (ou seja, manda tweets) e faz afirmações que ombreiam com as do seu congénere (e confessado ídolo) Trump.

Que a destruição da Amazônia é uma tragédia, serei certamente uma das primeiras a subscrever. (Aliás, se tivesse sabido da manifestação, teria ido.) Mas: Que isso faça com que se dê força ao lóbi (grande) que existe na Noruega e que diz "aprendam espanhol, que serve para dois em um" -- reparem que nunca vi o argumento oposto, que seria "aprendam português, que dá para dois em um" (visto que o Brasil é muito mais importante do que o resto dos países da América Latina todos juntos, precisamente por causa da Amazónia... e não só, claro), parece-me uma falta de consciência triste.

Uma manifestação em Oslo que apresenta cartazes em espanhol e francês, mas não em português, que sinais é que dá ao Brasil, à embaixada, e ao mundo? Dois sinais, ambos péssimos: um, que não são os noruegueses que estão por trás da manifestação, mas um punhado de agitadores "internacionais" que andam a passear pela Europa. E/ou outro, ainda pior, na minha opinião, o de que os noruegueses não sabem nada sobre o Brasil, ao ponto de pensarem que lá se fala espanhol.

Tal qual como Bolsonaro, que confundiu recentemente  a Noruega com as ilhas Faroe. Mas se era para ser irónicos, os manifestantes, na minha opinião, deram um tipo no pé.

Teria custado tanto fazer cartazes em português para que chegassem de facto aos brasileiros que não vivem na Noruega? Eu própria me ofereço para traduzir cartazes a quem quiser a partir de agora fazer manifestações sobre o Brasil!

Se era para insultar o pessoal da embaixada, penso que é um insulto gratuito: todo o pessoal sabe inglês e até norueguês. Os únicos que ganharam com a colocação de um cartaz no Aftenposten em espanhol foram aqueles (e infelizmente oiço isto todos os dias na Noruega) que acham que basta saber espanhol para comunicar com o Brasil.

Gostaria de ver como é que os outros países da América Latina reagiriam se fôssemos para a frente das embaixadas deles com cartazes em português -- e nenhum em espanhol! Talvez percebessem, não é isso que está em questão, mas duvido muito de que gostassem. Eu não gostaria... mas não sou brasileira :-(

E estou a começar a perceber que a minha "ingerência" nos assuntos brasileiros, como portuguesa, não é bem vinda. É pena, porque é/ tem sido feita com a melhor das intenções. Mas todos sabemos que, dessas, está o inferno cheio.

 

Publisert 25. aug. 2019 15:31 - Sist endret 25. aug. 2019 15:31