O valor da liberdade

Num grupo com o Mário, a Marta e o Miguel, começámos a discutir o que é a liberdade para nós, para tomarmos parte nas comemorações do 25 de Abril. E, como muitas outras coisas boas que temos e não apreciamos quando as temos, como a saúde, por exemplo, também não é algo que eu tenha presente. Só quando me tentam coartá-la. Mas o que é a liberdade para mim? Ou, mais especificamente, em que lugares me sinto livre, e com que pessoas?

Estas duas perguntas foram-nos postas pelo Mário, e confesso: não são algo em que eu alguma vez tenha pensado. Mais provavelmente, terei sentido lugares opressivos e pessoas que não me deixam ser livre, mas não o contrário. E por isso foi muito interessante ser obrigada a refletir sobre isto.

Os lugares, não são geográficos nem físicos. São dois tipos de "lugares abstratos", mas que me vieram imediatamente à ideia: ao ouvir música; e estar numa conferência, ou reunião, em que se debatem ideias.

A música pode ser considerada como uma espécie de droga, em que saímos do nosso status quo para regiões mais livres e menos constrangidas -- e talvez também com menos responsabilidade. Desde que me lembro, ouvir música foi para mim uma libertação, uma fuga para o reino da imaginação, e uma espécie de forma de me tornar mais forte, e diferente. É também por isso que considero a dança uma forma de me realizar e de viver o momento. Mas não é uma liberdade muito responsável, seria talvez mais escapista, mas sempre gostosa. Muitas músicas de intervenção me ajudaram a acreditar num mundo melhor, por isso a música também está ligada ao 25 de Abril. É interessante que Aristóteles falou que havia dois tipos de música, aquela que fazia apelo aos bons sentimentos, e aquela que provocava os maus. É impossível  reconstituir a música desse tempo (o que me faz muito curiosa), mas posso dizer que a música que me faz sentir livre é claramente aquela que me desperta os bons sentimentos: ouvindo-a sou mais corajosa, mais intrépida, mais decidida, mais generosa, menos constrangida.

Já em relação à troca de ideias, o estar numa conferência a ouvir ideias que me soltam e (também) desafiam a minha imaginação, e poder dizê-las em resposta ou em troca, mesmo que depois a troca de ideias fique por aí, é das alturas em que eu me sinto mais livre e criativa. Isto pode parecer muito específico, e também muito romântico — afinal de contas já todos estivemos em conferências chatérrimas em que só ouvimos coisas chatas e pouco interessantes — mas às vezes há trocas de ideias ou mesmo algo que nos faz dizer com os nosso botões "ah, nunca tinha pensado nisso!". E por vezes faz-nos levar essa ideia (ou a sua crítica) avante e dizer coisas novas, em público. Essa sensação para mim é de liberdade total, e é muito agradável.

Muitas vezes fica só por aí, outras vezes faz com que eu discuta e mencione essas ideias, e/ou as minhas reações, a outra pessoas. Mas a liberdade de pensar e de criar "modelos novos" é talvez aquilo que eu associo mais à ideia da liberdade como um estado desejável e absolutamente necessário à humanidade.

Por isso me parece que a troca de ideias e a recusa da censura (a todos os níveis, desde religiosa ao politicamente correto dos nossos dias) são muito importantes. Porque a liberdade para mim é mais mental do que física, e mesmo "presa" não podem prender um espírito livre -- se o espírito for livre.

Quanto a pessoas com quem me sinto particularmente livre, pensei logo numa, que não vou mencionar aqui, mas apenas os traços dela que me inspiram: é uma pessoa que adora trocar ideias, que está sempre entusiasmada com ideias novas, e que tem grande confiança na minha capacidade de compreender as suas ideias, e de ter ideias boas. Sei que de um nosso encontro venho sempre com novas ideias e com mais confiança em mim própria e na humanidade.

 

Publisert 7. feb. 2023 12:17 - Sist endret 7. feb. 2023 12:52